Isto de crescer e de nos tornarmos adultos ??, na grande maioria das vezes, uma grande treta em parte porque come??amos a aceitar como verdadeiras algumas coisas que sempre soubemos ao longo da nossa exist??ncia mas que nunca fizemos caso e, uma delas, ?? aquela me encanita mais: o facto de algumas pessoas n??o serem infinitas.
Hoje, a primeira coisa que a minha m??e fez quando chegou a casa, foi vir ter comigo. Nem tirou o casaco nem nada. Vinha de semblante carregado e olhava-me com muito cuidado. Soube nesse momento que n??o podia vir dai coisa boa e que ela estava a tentar arranjar uma maneira de suavizar o golpe. No entanto sendo a minha m??e t??o ou mais subtil que eu – n??o somos – e como n??o sabemos tamb??m meter paninhos quentes nas situa????es disse-me finalmente que A tua professora Piedade faleceu.
Como assim? Desculpa? N??o devo ter ouvido bem. Repete l?? isso, se faz favor.
Caiu-me tudo. Fiquei sem reac????o durante um par de minutos mas s?? agora, a estas belas horas, ?? que me caiu a ficha e me apercebi da finalidade da frase que a minha m??e me tinha dito ?? hora de almo??o.
Que aquela senhora – que tinha a mesma altura que eu – j?? n??o vai dar mais aulas a mi??dos assustados de d??cimo ano que n??o fazem a m??nima ideia do que fazer ??s suas vidinhas.
Conto pelos dedos os professores que me marcaram ao longo do meu percurso escolar, n??o que a maioria tivesse sido m?? (que tirando um ou outro foram todos maravilhosos), mas ums marcaram-me mais que outros dependendo da altura da minha vida em que me encontrava. E a Professora Piedade foi uma dessas professoras. Nunca conheci uma senhora com um cora????o t??o grande e t??o cheio de amor como a Professora Piedade.
Tenho muito que lhe agradecer at?? porque ela foi uma das respons??veis por me moldar na pessoa que sou hoje. Foi ela que me fez apaixonar verdadeiramente por Biologia. Foi ela que aprendi a ter paci??ncia de santa quando ela foi a minha professora-orientadora de ??rea de Projecto e reparou que eu ficava frustrada quando n??o conseguia concluir as coisas ??s quais me tinha proposto. Que se preocupou quando, no meu d??cimo ano, comecei a ter crises de ansiedade e era-me fisicamente imposs??vel ficar trancada numa sala durante muito tempo. Que sempre viu um grande potencial em mim e que, apesar de ser apenas uma rapariga de quinze – e depois de dezassete – anos, aceitava as minhas opini??es como se fosse uma pessoa crescida. Que me dava o benef??cio da d??vida quando queria fugir um bocadinho aos procedimentos das aulas pr??ticas e tentar as coisas ?? minha maneira. ?? certo que noventa porcento das vezes eu falhava redondamente e tinha de me resignar e voltar a seguir os passos todos sem liberdades art??sticas mas, nos dez porcento em que de facto as minhas ideias brilhantes resultavam, ela era a primeira a vir ?? minha bancada, a me sorrir e a me dizer que tinha feito um bom trabalho. Quando falhava o discurso era parecido s?? lhe acrescentava que da pr??xima vez ia correr melhor e eu agradecia-lhe mentalmente o encorajamento.
Lembro-me tamb??m que a Professora Piedade era das poucas na escola que ainda dava as aulas todas atrav??s de acetatos e que era aborrecidas. Na altura achei aquilo estranh??ssimo mas com o tempo comecei a simpatizar com a quirkiness daquela senhora e a v??-la por aquilo que ela realmente era: algu??m que n??o tinha medo de ser quem era. Tamb??m me lembro que ela usava sempre as cal??as muito puxadas para cima e que cheirava sempre a caf?? e a p??o com queijo. Que dizia treize e n??o treze. Que trope??ava sempre no fio do retroprojector independentemente da quantidade de vezes que ela o usasse e o ligasse. E que na ??ltima aula dos per??odos lectivos nos dava sempre um bombom.
A Professora Piedade era uma mulher com M grande. Cuidou da m??e doente durante anos at?? que a senhora faleceu no ano em que ela me deu ??rea de Projecto. Vi o que isso fez com ela e na altura n??o soube o que fazer. Se fosse hoje tamb??m n??o saberia, mas pelo menos teria feito mais do que lhe ter dado um abra??o um dia depois de uma aula comprida e especialmente dif??cil.
Nunca casou nem nunca teve filhos mas nunca ficou triste por causa disso.
E agora a vida levou-ma.
Ainda nova.
Ainda com muitas mentes para inspirar, moldar e demonstrar como ser uma pessoa ??s direitas.
?? engra??ado como damos peda??os de n??s ??s pessoas que nos rodeiam sem nos apercebermos mas quando elas saem da nossa vida – seja porque motivo for – sentimos-nos mais despidas. Sem um bocadinho da nossa ess??ncia.
Mas tamb??m ?? engra??ado aquilo que recebemos em troca, sobretudo se for bom.
A vida levou-ma mas ela vai ficar-me sempre. ?? professora que pegou numa miudinha assustada de quinze anos e lhe mostrou que tudo ia correr bem e que eventualmente iria descobrir qual era o seu caminho: obrigada.
??? diz
Tens raz??o Ana, h?? pessoas que nos marcam e h?? pessoas que deviam ficar para sempre. Pena n??o poderem estar sempre connosco. Descanse em paz Professora Piedade. Os meus sentimentos.
Nancy Wilde diz
Gostava de ter tido t??o boa recorda????o de professores meus mas n??o tive. Lamento a perda, sei que deves estar abalada com a morte de algu??m que acrescentou algo ?? tua vida. O facto ?? que a vida ?? mesmo curta, muita gente ainda age como se o tempo fosse infinito, como se o amanh?? e o depois de amanh?? estivessem garantidos… D?? que pensar, n??o ??? Ainda h?? dias uma rapariga de 17 anos c?? do Algarve foi violada e assassinada pelo padrasto… H?? com cada uma… Penso "podia ter acontecido a qualquer um de n??s" e talvez seja isso que me fa??a querer aproveitar e valorizar mais a vida e os momentos que ela nos d??.
C??tia diz
H?? sempre professores que nos marcam. Felizmente tive professores que me marcaram mas que ainda est??o vivinhos da silva. Quando um dia isso acontecer com certeza que irei mesmo ficar muito triste.
Diana Oliveira diz
Compreendo o que sentes e de certeza que ela iria gostar muito destas tuas palavras 🙂
uma abra??inho forte 🙂
beijinho
Sofia diz
Gostava de saber o que te dizer mas tamb??m n??o sei…
fashionskribo diz
Aww lamento a tua perda.
Eu pelo contr??rio s??o muito poucos os professores que considero que me tenham marcado, mas tamb??m tenho uma personalidade muito dif??cil para as pessoas cairem nas minhas "boas gra??as". De qualquer modo, n??o sei como reagiria se algumas das minhas professoras favoritas falecesse – quer dizer, esse momento vai chegar, como ?? ??bvio, mas espero que seja prolongado o mais poss??vel.
Alexandra Cardoso diz
Lamento a tua perda e espero que ainda encontres mais pessoas na tua vida que te marquem de igual forma. 🙂
Sorrisos,
Alexandra 🙂
The Sweetest Life
dee diz
J?? pensei nisso. N??o fa??o ideia como seja. Mantenho contacto com uma professora do ciclo, outras de liceu e uma da faculdade e n??o imagino o que seja saber que uma delas partiu ainda que n??o as veja muitas vezes. Sinto-me muito grata pelas pessoas que tive a ensinarem-me. ???