ROTEIROS | Quinta da Regaleira, Sintra

Quando chegamos ?? vila de Sintra depois de visitarmos o Pal??cio da Pena e o Castelo dos Mouros j?? est??vamos cansados mas j?? s?? t??nhamos uma ??ltima paragem no mapa que n??o pod??amos, de todo, deixar de visitar: a Quinta da Regaleira.

Se v??m de Lisboa para Sintra de comboio a Quinta da Regaleira fica a uns cinco minutos a p?? da esta????o. Se v??m do Castelo dos Mouros (como n??s) t??m de andar uns quinze minutos, que se fazem muito bem porque ?? sempre a descer, e ao chegar ?? vila ?? s?? seguir das placas e n??o h?? nadinha que enganar.

A Quinta da Regaleira ??, para mim, um dos monumentos mais underrated em Sintra. Quando chegamos l?? perto das tr??s da tarde n??o havia basicamente ningu??m na fila para comprar o bilhete. Se formos a comparar com o Castelo dos Mouros e o Pal??cio da Pena, a Quinta da Regaleira ?? uma daquelas coisas que passa entre os pingos da chuva aos turistas e n??o devia!

O bilhete, em compara????o aos outros dois monumentos, ?? barato. Cada um de n??s pagou ???4,00 para entrarmos na Quinta da Regaleira, andarmos ?? nossa vontade e sem restri????es de tempo. Quando compram o bilhete tamb??m vos d??o um mapa e sugiro que n??o o guardem nas mochilas porque este, muito a par com o do Pal??cio da Pena, vai ter de ser usado constantemente.

?? primeira vista a Quinta da Regaleira parece pequena e muitos podem julgar que tudo o que h?? a visitar ?? aquele edif??cio todo trabalhado e cheio de rococ??s que se v?? do lado da estrada. N??o, meus senhores, n??o ?? s?? isso. A Quinta da Regaleira foi, sem sombra de d??vidas, o s??tio mais bonito que eu j?? visitei. E o mais misterioso. E o que me deixou sem palavras. E o que me faz querer l?? voltar todos os dias.

Quanto eu entrei na Quinta mal conseguia tirar os meus olhos do pal??cio dentro da Regaleira. Os meus p??s insistiam em ficar colados ao ch??o enquanto eu olhava tudo de cima a baixo. Era uma vis??o que me era familiar mas n??o conseguia compreender porqu?? e em nada tinha a ver com a breve passagem ao lado h?? cinco anos na minha primeira vez em Sintra.
Nunca l?? tinha entrado e as fotografias mentais que tinham sobrado estavam – na melhor das hip??teses – muito apagadas. No entanto fiz um scan ?? minha mem??ria em busca de sinais do porqu?? tudo me parecer t??o familiar e finalmente cheguei a uma conclus??o. Isto era a casa que eu conjurava na minha imagina????o quando lia as short stories de Edgar Allan Poe. Isto era a minha Casa de Usher.

A Quinta de Regaleira como a conhecemos hoje foi contru??da entre 1904 e 1910 quando o terreno foi adquirido ?? Viscodessa da Regaleira pelo Dr. Ant??nio Augusto Carvalho Monteiro (tamb??m conhecido como Monteiro dos Milh??es ap??s fazer fortuna no Brasil).
Monteiro contrata o arquitecto e cen??grafo italiano Luigi Manini para transformar os seus projectos grandiosos da Regaleira em realidade.

Carvalho Monteiro era um conservador, mon??rquico e crist??o gn??stico, logo quis ressuscitar o passado mais glorioso de Portugal quando idealizou os seus projectos para a Quinta. Por causa disso existe a predomin??ncia do estilo neomanuelino com a sua liga????o aos descobrimentos espalhados por v??rios cantos da Regaleira. Esta evoca????o do passado passa tamb??m pela arte g??tica e alguns elementos cl??ssicos. Carvalho Monteiro era um homem com interesses variados por isso podemos ver v??rios elementos simb??licos por todo o lado relacionados com a alquimia, ma??onaria, templ??rios e rosa-cruz.
Tudo na Quinta da Relageira tem um significado, e quando eu digo tudo ?? tudo mesmo.

A primeira coisa que visitamos foi o Patamar dos Deuses. ?? composto por nove est??tuas de deuses greco-romanos cada uma com um significado. A escolha destas estatuetas est?? est?? intimamente relacionada com os interesses de Carvalho Monteiro e com a Regaleira em si.

O primeiro Deus representado ?? Merc??rio (mitologia romana) ou Hermes (mitologia grega), que era conhecido por ser um mensageiro dos Deuses, sendo a liga????o do Homem com os mesmos. De seguida temos Vulcano, muito associado ao fogo e que remete para o gosto de Carvalho Monteiro pela alquimia, com a no????o que a mat??ria tem de morrer para renascer, mais pura, das pr??prias cinzas.
Dion??sio (mitologia grega) ou Baco (mitologia romana), o terceiro Deus, era o Deus da festa, do vinho e do ??xtase. Era tamb??m o promotor de uma das grandes paix??es de Carvalho Monteiro: a trag??dia grega, nomeadamente em forma de arte de palco, livros ou ??pera.
O Deus P??, representado metade homem e metade bode, simbolizado a parte activa da natureza pois P?? era um grande sedutor das ninfas.
Ceres (mitologia romana) ou Dem??ter (mitologia grega) era a Deusa da fertilidade da terra e a respons??vel pelo aparecimento dos cereais, tendo um grande papel na explica????o mitol??gia das quatro estac??es do ano.
Flora, a Deusa das flores, ?? de uma import??ncia maior para Carvalho Monteiro pois este era bot??nico.
V??nus (mitologia romana) ou Afrodide (mitologia grega) toma um papel especial pois remete para o amor que Carvalho Monteiro tem pelas obras que o inspiraram para construir a Regaleira (Odisseia, Eneida, Divina Com??dia e Os Lus??adas).

Mais ?? frente neste patamar, podemos encontrar um le??o, que tem o intuito de representar a monarquia, principalmente o Rei (e que a mim s?? me lembrou de N??rnia).
Depois vamos encontrar a est??tua do Deus Orfeu que representa todos os seres humanos que iniciam a busca pela salva????o e a Deusa Fortuna (mitologia romana) ou Tyche (mitologia grega), a Deusa da boa sorte que fornecia o destino, por livre arb??trio quando uma alma iniciava essa busca/caminhada e ??ltima estatueta das nove.

Se existem coisas aos montes na Quinta da Regaleira s??o grutas, t??neis e torres. E muita ??gua. Uns quantos lagos e muitas, muitas ??rvores e vegeta????o.
Voltado ??s grutas e t??neis: na Quinta da Regaleira temos oito no total (T??nel da Capela, Gruta do Labirinto, Gruta da Leda, Lago da Cascata, Gruta do Oriente, Gruta do Aqu??rio, Po??o Imperfeito e Po??o Inici??tico). Uma coisa interessante ?? que podemos percorrer a Quinta da Regaleira basicamente de l??s-a-l??s debaixo de terra gra??as ??s liga????es que existem entre grutas, po??os e t??neis.

N??o conseguimos ir a todas, com muita pena minha. Mas ??s que fomos posso dizer que ficamos completamente deslumbrados. Aconselho-vos a levar uma lanterna (ou a usarem a do vosso telem??vel) porque os t??neis s??o muito trai??oeiros e est??o completamente ??s escuras. Tenham cuidado com os degraus (que os h??), com as curvas e contra-curvas, com as po??as de ??gua e com as outras pessoas.
?? uma experi??ncia bastante interessante navegar pelos t??neis da Regaleira porque tudo o que temos ?? uma lanterna e um sem n??mero de t??neis com v??rios caminhos que podemos seguir. Nenhum ?? errado e se eu n??o me perdi para sempre nos confins daquelas grutas voc??s tamb??m n??o se v??o perder!

Das coisas mais curiosas da Quinta da Regaleira sem d??vida que o Po??o Inici??tico est?? em grande vantagem. Este po??o tem uma escadaria constitu??da por nove patamares separados por lan??os de quinze degraus cada um, invocando refer??ncias ?? Divina Com??dia de Dante e que podem representar os nove c??rculos do inferno, do para??so ou do purgat??rio.

Se virmos o po??o de cima, reparamos numa Rosa dos Ventos, que orientaria os iniciados. Simulando o centro do universo, o po??o oferece quatro sa??das ou direc????es, sendo que a que leva ?? luz ?? a sa??da a Este.

Depois da Regaleira (propriamente dita) mais ou menos explorada e com o barulho de trovoada ?? dist??ncia (sim, sente-se as quatro esta????es do ano num dia em Sintra) decidimos que a coisa melhor a fazer seria visitar o interior do Pal??cio. Foi uma visita r??pida visto que quando chegamos aos terra??os come??ou a chover banheiras de ??gua.

A nossa visita – apesar de molhada – acabou da melhor maneira. Ainda conseguimos ir ouvir um pequeno concerto de jazz (com cantora e pianista) num dos sal??es nobres do Pal??cio. Haver?? melhor maneira (e mais posh) de acabar um dia em grande? N??o, n??o me parece.

Como se estava a aproximar da hora de apanhar o comboio de volta ao Oriente e a chuva n??o dava sinais de abrandamento decidimos que t??nhamos mesmo de nos fazer ?? estrada e com contas imposs??veis de um mini guarda-chuva para quatro pessoas consegu??mos chegar ?? vila minimamente secos. Para uma paragem obrigat??ria n’A Piriquita para irmos buscar os travesseiros e as queijadas que ainda estavam quentinhos. E que continuam absolutamente deliciosos!

Resumindo: visitar a Quinta da Regaleira ?? partir para uma viagem espantosa a um Mundo de imagina????o, criado no meio da Natureza. Quero l?? regressar. E espero que voc??s fiquem com vontade de l?? ir!