Lembro-me perfeitamente do dia em que soube que não ia ao Rock in Rio Lisboa 2018. Tinha acabado de sair de uma frequência, que achava que me tinha corrido mal mas que, no fim, me deu uma boa nota, com a excitação que quem tinha andado a pôr dinheiro de parte para ir a concertos. O bilhete para o dia do Bruno Mars estava esgotado. Custou mas aceitei. Passei ao próximo na lista: Thirty Seconds to Mars no Campo Pequeno. Esgotado. Ouch. Arctic Monkeys no Alive? Esgotadíssimo. Nessa altura já nem doeu. Esta introdução foi dramática, desculpem, mas fiquei mesmo triste. Passei de três concertos para zero, em dez minutos.
No entanto a vida seguiu e eu esqueci-me do assunto. Era chato não ir ver o Bruno Mars, mas há coisas piores. Até que o meu namorado sabe que vai tocar ao Rock in Rio. E eu pensei que ele me conseguisse arranjar um bilhete. Ele foi tocar dia 29 de Junho. O Bruno Mars era dia 24 de Junho. Nada feito. Nessa altura já nem estava chateada e não estava activamente à procura de um bilhete para esse dia. Aceita que dói menos.
Depois soube que eles iam ter credencial para todos os dias do festival. E que podiam ir ver o Bruno Mars se quisessem. Mas o Mário, firme, disse que só ia se eu fosse. Mas não havia maneira de eu ir, nem de me arranjar credencial. E é nestas alturas que reparo que quase toda a gente dos blogs tinha uma. Mas eu não. E senti-me pouco fixe. Mais do que pouco fixe… chateada. Porque andava há meses a querer ir àquele concerto. Andei a juntar dinheiro e depois… esgotado. Não havia nem uma alma, de todos os contactos que ele tinha, que conhecessem alguém que estivesse a vender bilhetes a preços aceitáveis (houve uma pessoa que anunciou que estava a vender a preço de custo – €69 – mas depois, afinal, estava a vender a €150. Ri-me e não comprei, claro).
Do meu lado dizia-lhe para ele ir ver o concerto por mim. Depois dizia-me como tinha sido. Para se ir divertir com os outros membros da banda que iam ver o concerto. Que eu logo ia da próxima. Não, não e não, disse-me. E assim foi. Saímos de casa para irmos almoçar fora e não pensar mais no assunto.
O GRUPO DE FACEBOOK E O HAIL MARY
Nesse dia tive de ir a casa da Cat para lhe devolver umas coisas. A ideia era passar um serão com ela, o Mário, o Pedro e os gatos. Até que lhe falei da minha frustração com o querer ir e não conseguir.
Eles perguntaram-me muito casualmente se já tinha experimentado grupos no Facebook de troca e venda de bilhetes.
Como é? Grupos no Facebook dessas coisas? Sou-vos sincera quando digo que nem me passou pela cabeça. Fomos a um e lá encontrei dezenas de pessoas a vender um malfadado bilhete para o Bruno Mars. Uns a preços mais ridículos que outros, mas quase todos bastante razoáveis.
O Mário só me disse para comprar. Demorei alguns segundos a dizer que sim.
Há uma coisa que precisam de saber sobre mim: até há bem pouco tempo (mais ou menos dois anos), eu era a miúda dos planos. Não gostava de fazer nada sem ser planeado antes só para ter a certeza que ia correr bem. Eu sou aquela que tem uma viagem a Barcelona planeada sem data de ida. Agora estou muito melhor e ir, sem planos, fazer alguma coisa já não é algo que me deixa a pele em chamas.
Havia um bilhete a 90€ em Óbidos. Estávamos em Lisboa. O Mário quis ir na mesma. Até que apareceu um a €80, bem perto de onde estávamos com um senão: tínhamos de ir de imediato, que haviam muitos interessados. E fomos. E comprei o bilhete a uma rapariga muito simpática perto do recinto.
Eram 16h30 quando comprei o bilhete, 17h15 quando chegámos a casa só para trocar de sapatos e arranjar um casaco e levar a mochila comigo, 17h20 quando chamámos um UBER para irmos até à Bela Vista, 18h40 quando estávamos todos lá dentro do recinto da Cidade do Rock.
A EXPERIÊNCIA NO PRIMEIRO DIA
O último ataque de pânico que tive foi num arraial académico, no meu segundo ano de Universidade, na primeira noite que trajei porque me senti presa, num momento de dança, com rapazes de metro e oitenta a me cercarem. A Bia de Aveiro (uma amiga da Universidade) deu comigo a desapertar a gravata, branca que nem cal, com o olhar fixo sabe-se lá onde e a transpirar. Levou-me dali para um sítio mais calmo, com cadeiras e foi pedir um copo de água enquanto eu me desapertava daquele traje: tirei a gravata, abri a camisa e o casaco e embrulhei-me na capa porque era Novembro e, apesar do choque, estava com frio. Não quis saber se estava bem ou mal trajada naquela altura. O Mário apareceu pouco tempo depois para me levar a casa – com a Bia – e eu nunca mais fui a um arraial. Nem a nenhum ambiente que me fizesse sentir assim.
O dia do Bruno Mars estava esgotado. Eram esperadas cerca de noventa e cinco mil pessoas no recinto. Só me lembrei disto quando estava lá dentro e vi enchentes de pessoas. Mas sabem que mais? Nem por um segundo me senti ansiosa. O recinto era amplo e havia sempre um sítio para onde ir caso me sentisse apertada. Vi os concertos no monte como quem ia para a tenda VIP, sem pessoas chatas à minha volta a me invadirem o espaço pessoal, sem me sentir inibida e a divertir-me para caraças. Consegui ver, verdadeiramente, o espectáculo que o Bruno monta. Não andei de roda gigante, não vi Demi Lovato. Vi Anitta mas não gostei (aquilo para mim foi uma aula de zumba em massa), fui ver Dillaz ao Palco Music Valley e depois vi Bruno. E delirei. Pulei. Cantei todas as músicas. Apercebi-me que me ia arrepender amargamente para o resto da vida se não tivesse comprado aquele bilhete.
O meu grupo nem sequer pensou em ir para onde estava um mar de gente. Jantámos entre concertos, porque as filas eram mais pequenas. Não sei se fizeram de propósito ou não, mas foi um gesto bonito.
Não tenho nada a apontar de negativo neste festival. Foi a minha primeira vez e eu, que sempre evitei festivais por culpa das pessoas e de ter receio de me sentir presa e sufocada, mal posso esperar para voltar.
MAS A AVENTURA NÃO ACABA AQUI!
Era um dado adquirido que ia ter bilhete para dia 29 de Junho porque eles iam lá tocar. Não fazia questão de ver os The Killers nem os The Chemical Brothers. Só queria mesmo ver o meu namorado a tocar num palco no Rock in Rio. Era importante para ele e eu queria estar lá. Nunca faltei a nenhum momento de viragem para a banda e não ia começar agora. Até que me dizem, no dia anterior, que afinal não há bilhete para ninguém. Que eles deviam ter avisado com um mês de antecedência de quem ia e que assim não podiam fazer nada. O dia nem estava esgotado.
Aparece a Sara e arranja-me um. Fomos a correr para o recinto, que o concerto começava às 15h40 e eram já 15h30.
Só perdemos uma música, e o sorriso que ele me dá quando me vê fez valer a pena o facto de ir cuspindo um pulmão. É uma coisa engraçada sobre nós: ele encontra-me sempre no meio da multidão, por mais gente que esteja.
A meio do concerto começou a chover, mas nós não saímos dali. Acabou o concerto e acabou a chuva, o grupo separou-me (uns foram para casa, outros ficaram) e dei por mim a aproveitar o festival como deve de ser, mesmo com chuva – e uma capa ridícula que foi a minha salvação – porque não estava quase ninguém. Continuei sem ir à roda gigante, mas fui com o Mário fazer uma tatuagem à Rock Street para ele assinalar o dia em que tocou no Rock in Rio. Comemos pizza. Conhecemos uma senhora e o seu filho, na mesa onde nos sentámos, e estivemos duas horas à conversa. Não vi The Killers, mas vi parte do set dos The Chemical Brothers. Vimos Xutos à chuva. E divertimos-nos para caraças.
Acabámos a noite na Revenge of the 90s que estava a acontecer no Music Valley – e delirei. Foi o fim incrível a uma experiência memorável. Gostava de ter coisas mais conclusivas a dizer para além de gostei muito, mas eu gostei – mesmo – muito. E por mim revivia estes dias outras vez, vezes sem conta.
Eu fui, e quero voltar.
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